Gelados. As fábricas onde gostávamos de trabalhar
Na fábrica do Santini fazem-se 600 litros de gelados por dia e esperam-se mais com a abertura da loja em Lisboa, na sexta-feira. Na Artisani, alguns gelados são batidos à mão
Entrar na fábrica da Santini, a geladaria mais famosa do país, é como entrar numa sala de operações. À porta, Eduardo Santini, de 33 anos, neto do geladeiro italiano e fundador da casa, Attilio Santini, recebe-nos com toucas, batas brancas e sacos azuis para os sapatos. Só assim equipados podemos entrar no armazém perto da estação de São João do Estoril onde, desde há 5 anos, se fazem 600 litros de gelado por dia.
Na fábrica onde tudo está pintado de branco - paredes, tecto, os doze empregados e até nós próprios, fardados a rigor - a agitação começa cedo. Às oito da manhã chega a fruta que será lavada e descascada por duas senhoras atarefadas: morangos gigantes como não se encontram no supermercado, limões invulgarmente amarelos, mangas bem cheirosas e espécies mais exóticas como maracujá roxo ou pêssego paraguaio. "O sabor mais pedido é morango", esclarece Eduardo, perante a torre de caixas que se ergue junto ao lava-loiças, onde a fruta é "seleccionada e desinfectada".
Em breve, os morangos estarão na sala ao lado, o "laboratório", como é conhecida. É aí que Eduardo Fuertes, de 61 anos, o genro de Attilio Santini, guarda a receita que herdou quando o geladeiro italiano morreu em 1995. "Ele adoeceu e tive de começar também a fazer gelados", conta. Há 35 anos, no dia em que pôs os pés pela primeira vez em Portugal (arrastado pela sua namorada, a filha de Santini) começou logo a trabalhar ao balcão da loja de Cascais. "Na altura éramos só três a atender: eu, a minha sogra e mais uma empregada", conta Eduardo Fuertes. "Passávamos o dia a trabalhar e no Verão nem via a praia. Era lá que fazíamos também os gelados, numa sala que não era nem metade desta."
No laboratório, Eduardo Fuertes pesa numa pequena balança o açúcar que será colocado no balde onde já está a fruta esmagada. Numa prateleira estão frascos com "alguns ingredientes que temos de ter sempre à mão", como o manjericão, essencial para combinar com limão, um dos sabores clássicos.
Vários empregados apressam o passo no corredor da fábrica com baldes de gelado na mão. Alguns já saíram da máquina que vomita gelado com a consistência exacta e estão prontos a serem armazenados numa das salas frigoríficas onde se lê "Produto Final" ou levados para a loja. Outros ainda precisam de ser batidos ou pasteurizados. O genro de Attilio Santini prevê que, em breve, a fábrica onde nas paredes até se vêem fotografias do rei de Espanha - um dos muitos fãs destes gelado - se torne pequena. Na próxima sexta-feira (ou na quinta-feira se o balcão que vem de Itália chegar mais cedo), a loja Santini no Chiado abre as portas. Eduardo está preparado para a enchente e acredita que a produção pode aumentar para 1300 litros de gelado por dia, a capacidade máxima da fábrica.
UM CAROÇO NO GELADO
Luísa Lampreia, de 35 anos, está prestes a inaugurar uma fábrica dentro da sua loja de gelados, a Artisani, que abriu as portas no início de Junho, na Avenida Álvares Cabral, em Lisboa. "Através do vidro, os clientes vão poder ver os gelados a serem feitos e a saírem das máquinas", conta. "Vai ser bom porque muitas vezes as mães não deixam os filhos comer mais um gelado porque acham que lhes vai fazer mal. Não sabem que é só fruta e água. O único mal que pode haver é o açúcar."
Para que não fiquemos com dúvidas, Luísa mostra-nos a fábrica onde actualmente os gelados são feitos para a loja e para revenda em restaurantes de chefes como Chakall ou Vítor Sobral. Num armazém modesto na Rua do Olival, em Lisboa, Isabel, de batedeira na mão, tritura polpa de pêssego para um gelado, ritual que repete todos os dias desde há 26 anos. De repente, a batedeira encontra um objecto sólido: Isabel não tinha reparado num caroço dentro do balde. "É para ver como os gelados são feitos mesmo com fruta e água." Água do Luso, como sublinha a carta da geladaria que até tem baloiços mais apelativos do que os do Jardim da Estrela, ali mesmo ao lado. Mais artesanal é quase impossível.
Via Ionline