Tem 22 anos e chama-se Zoé. A culpa é dos pais. E, na verdade, até teve sorte. O plano inicial era outro. Zoé esteve para se chamar Tamagnini, mas a mãe não deixou. Vítor Silva, o pai, descobriu a segunda opção num prontuário e não esteve com meias medidas: foi sozinho ao cartório e registou o nome sem a mulher saber. Na família Silva, Zoé não é o único que tem um nome diferente.
A irmã, de 25 anos, chama-se Andresa. Agora, a diferença até passa despercebida, mas na escola primária Zoé não conseguiu evitar as piadas das outras crianças. "O maior problema eram as rimas que dava para fazer com o meu nome, como chulé e outras coisas desagradáveis", recorda. Um dia, fartou-se. Chegou a casa e disse ao pai que era gozado. "Ele disse-me para não ligar, mas eu só pensava que a culpa era dele e que era fácil falar... afinal de contas não era o meu pai que tinha de lidar com os miúdos todos os dias", conta. Por isso, Zoé teve de encontrar as suas próprias tácticas para resolver o problema. "Todos os nomes, mesmo os mais convencionais, davam para fazer rimas ainda piores, como João. E se não me lembrasse de nada na hora, ia para casa pensar e no dia seguinte lançava a bomba. Quando não encontrava rimas, tinha de me calar e esperar que a piada caísse no esquecimento."
A importância do nome Na infância, o nome próprio assume um papel extremamente importante no crescimento. É o primeiro bilhete de identidade da criança e uma característica que a acompanhará para o resto da vida. "Os nomes não condicionam", sublinha o psiquiatra Daniel Sampaio. "Mas influenciam as crianças e disso não há dúvida." Numa altura em que a criança está a construir a sua identidade, o nome "é determinante na maneira como estabelece a primeira ligação ao mundo social", refere o psiquiatra. Por isso, quando o nome é demasiado invulgar, é frequentemente alvo de críticas "dos colegas e até dos professores". Ao invés, quando o nome transporta a referência a um antepassado da família de quem a criança tem uma imagem feliz, "estabelece-se uma influência positiva".
E agora? Bato-lhes? O pediatra Gomes Pedro diz que é nesta guerrilha que a criança "constrói a sua afirmação e a sua auto-estima". Apesar disso, Rita Jonet, psicóloga infantil, acredita que os nomes, por si só, não são factores de exclusão social. "Tudo depende do clima da escola. Se a troça e a ridicularização forem comuns então tudo é pretexto para se gozar o próximo, até os nomes", explica.
Mas há outros factores que interferem na socialização na infância como "a maneira de vestir, de falar ou de brincar". Os adultos, sublinha a especialista, têm um papel fundamental neste processo, "porque são modelos essenciais na aceitação das diferenças". Assim sendo, os pais têm mesmo de saber lidar com o problema. Gomes Pedro refere que a maior parte das crianças tenta esconder, em casa, que é ridicularizada e "quando conta aos pais é porque está realmente fragilizada". A eles cabe "prepará-la para que possa construir, a partir destes percalços, a sua auto-estima". Se as investidas dos colegas forem muito frequentes, então é hora de contactar a direcção da escola, "que deve pôr termo à situação". Até porque, como refere Daniel Sampaio, "a escola por vezes é violenta, tal como a sociedade o é". A criança nunca deve mostrar que fica afectada ou melindrada com as piadas dos colegas. Daniel Sampaio sugere várias técnicas que os pais podem transmitir aos filhos: "Deve contra-atacar e responder aos insultos com humor, um grande sorriso e até com orgulho por ser diferente."
Cristiano Ronaldo? Esqueça Se está a pensar chamar o seu filho de Cristiano Ronaldo ou Alexandre, o Grande, esqueça. Daniel Sampaio avisa que não é boa ideia atribuir nomes de figuras demasiado conhecidas às crianças - que vão ter sempre de conviver com a sua sombra.
"Traz-lhes grandes expectativas e uma pressão constante. Se um miúdo se chamar Cristiano Ronaldo e jogar mal à bola na escola será, certamente, ridicularizado", exemplifica. Pressões assim podem acarretar insegurança, ansiedade ou agressividade. O ideal é optar por nomes que "não se distingam muito dos da moda, mas que, obviamente, sejam do gosto dos pais". Deixando, então, de parte nomes mais espalhafatosos ou excêntricos.
Escolher o nome do filho é uma tarefa que requer muita ponderação. Alguns estudos demonstram que crianças com nomes estranhos têm notas piores e são menos populares do que os seus colegas na escola primária. No ensino superior têm mais hipóteses de chumbarem e de virem a sofrer de neuroses. Mas estas conclusões nunca reuniram o consenso dos investigadores. Os economistas Roland Fryer e Stephen Levitt defendem que estas consequências derivam não só do nome, mas de muitas variáveis socioeconómicas.
"Os nomes só têm influência significativa quando são a única coisa que se sabe sobre a pessoa", escreveu Martin Ford, psicólogo do desenvolvimento da Universidade George Mason. Contudo, a brasileira Regina Obata, que escreveu "O Livro dos Nomes" defende que os pais devem mesmo ter atenção aos nomes que escolhem. "É um atributo involuntário imposto pelos pais aos filhos e que pode abrir e fechar portas durante a sua caminhada. Deve sempre pensar-se se o nome não poderá submeter o filho a futuros problemas - quer por ser foneticamente desagradável, quer por ter um significado extravagante ou excêntrico."
Regras Em Portugal, o nome deve ter, no máximo, seis vocábulos em que os dois primeiros podem corresponder ao chamado nome próprio (ex. António Manuel) e os restantes ao chamado apelido ou sobrenome (ex. Soares Costa Fonseca Rocha). Os nomes próprios devem ser portugueses e admitidos pela onomástica portuguesa (catálogo de nomes próprios) ou adaptados fonética e graficamente à língua portuguesa e não devem suscitar dúvidas acerca do sexo. Os apelidos são escolhidos entre aqueles que os pais usem (os que pertençam a ambos ou a só um dos pais) ou outros a que os mesmos tenham direito, como por exemplo o apelido do avô que não conste do nome do pai.
Via ionline