20 de Fevereiro de 2009, Coimbra. Os fiscais da ASAE entraram numa loja do centro comercial Gira.Solum, descobriram vibradores, bonecas insufláveis, objectos fálicos, algemas e preservativos. Coisas de sexo, portanto. Ou, na linguagem da ASAE, "brinquedos atinentes à exploração da sexualidade ou destinados a serem utilizados como apoio ao acto sexual". Em resumo, bens "vendidos em sex shops, que carecem, legalmente, de licenciamento específico".
A loja situa-se um andar abaixo dos antigos cinemas do centro comercial, onde, desde Dezembro, funciona um templo da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). A ASAE também deu conta. Por isso, fez incluir no relatório o estipulado no Decreto-Lei 647/76: "Os estabelecimentos de comércio de objectos ou meios de conteúdo pornográfico ou obsceno não poderão funcionar a menos de 300 metros de locais onde se pratique o culto de qualquer religião." O resultado foi um auto de contra-ordenação, acompanhado da decisão de suspensão imediata de actividade. A sex shop estava aberta há 15 meses.
Marta Ferreira, dona da erotikshop Playground-Wanna Play, reagiu mal. "A minha intenção nunca foi abrir uma sex shop, muito menos vender pornografia." Além disso, garante que nunca ninguém, nas Finanças e na Câmara de Coimbra, lhe falou em licenciamento específico.
Quanto à IURD, Marta Ferreira começa por lembrar que o centro de convenções - assim se chama o dito espaço de reunião de fiéis - entrou em funcionamento já a sua loja tinha mais de um ano de funcionamento. Mais, o templo não tem licença camarária para utilizar o espaço como local de culto, mas apenas - e ainda - como cinema.
Por tudo isto, Marta Ferreira intentou uma acção judicial contra a ASAE. E ganhou. A decisão do 3º Juízo Criminal de Coimbra foi ontem lida e deixa claro que a sanção da ASAE não tem suporte legal e configura um "manifesto abuso de poder". Isto porque o regime legal em vigor só prevê o encerramento de estabelecimentos não licenciados depois de o processo estar concluído - e nunca com esta espécie de natureza "preventiva". Agora Marta admite tudo, incluindo, claro, processar a ASAE e pedir o ressarcimento dos prejuízos.
Lei defende quem chega primeiro. É tudo uma questão de datas e de quem chega primeiro. Nesta história, como nas corridas, os primeiros são os que vencem - ou os que deveriam vencer. Se o centro de convenções da Igreja Universal do Reino de Deus já existisse no Centro Comercial Gira.Solum em 2007, a Playground-Wanna Play nunca poderia fixar-se naquele centro comercial. O decreto-lei de 1976 (revisto em 2006, apenas para fazer a actualização da coima e passar os valores de escudos para euros) não deixa margem para dúvidas: "Uma sex-shop deve distar 300 metros de locais onde se pratique o culto de qualquer religião, estabelecimentos de ensino, parques ou jardins infantis."
No entanto, neste caso, o último a chegar foi mesmo o templo da IURD - em Dezembro de 2008. Segundo explicaram ao i vários especialistas em direito administrativo, a decisão ontem tomada pelo tribunal foi a correcta. "Quem licencia estes estabelecimentos é que tem de avaliar se o local onde a loja se vai instalar cumpre ou não os requisitos. A partir do momento em que o estabelecimento obtém a licença, esses requisitos já não se aplicam daí para a frente." O problema é que a legislação não prevê uma ressalva para os estabelecimentos já existentes. "Então agora os donos de uma sex shop vão ter de mudar de lugar de cada vez que alguém resolver abrir uma igreja, escola ou parque infantil a poucos metros?", questiona o advogado.
Ver o resto da noticia aqui
Via ionline