Pião
Os miúdos de hoje só conhecem a versão moderna: os Beyblade, por causa da série de animação japonesa com o mesmo nome. Na TV os piões são dominados por criaturas místicas; na realidade são de plástico, tal como a arena onde se encenam os combates. Ganha quem expulsar o adversário. As diferenças para os clássicos: não há mãos sujas de terra, nem aquele gozo especial de conseguir lançar o pião pela primeira vez – os novos caem sempre de pé.
Corredor da Morte
Também conhecido como “Estátua” é um dos jogos mais violentos dos recreios. Um dos miúdos – a vítima - tem de atravessar um corredor formado pelos colegas - as estátuas – enquanto estes tentam bater-lhe sem dar nas vistas. Se vir um deles a mexer-se trocam de posição. Se não, tem de voltar a passar pelo corredor. Uma lição de vida.
Berlinde
Havia os abafadores, as esferas, as vacas leiteiras, os olhos de boi e muitos outros especímenes, que se compravam noutra instituição em vias de extinção, a drogaria. Na versão mais popular, ganhava quem conseguia acabar primeiro o percurso formado por três covinhas escavadas na terra. O truque era ir desviando os berlindes dos adversários e, claro, ter pontaria.
Palminhas
Ainda se vêm em alguns recreios das escolas. Duas meninas ou mais entoam uma cantilena enquanto fazem uma coreografia, muitas vezes a velocidades estonteantes. Tal como no jogo do elástico, a coordenação e delicadeza exigidas afastam os rapazes. Desenvolve a memória e o método.
Lá vai alho!
Tudo terá começado com o jogo do eixo. Os miúdos transformaram-no num exercício de força e equilibrismo. Um jogador começa por saltar para cima de uma cadeia formada por outros jogadores e tenta chegar o mais à frente possível. De seguida, salta outro. E outro. E outro. Até a cadeia rebentar. Os riscos de acidente tornam-no desaconselhável, na opinião da pediatra Guiomar Oliveira.
Sirumba
Também conhecido por “Sete” e “Polícias e Ladrões”. Os ladrões tentam chegar ao outro extremo de um campo desenhado no chão, saltando de quadrado para quadrado. A missão dos polícias é apanhá-los, mas com movimentos restringidos: só podem andar nos corredores. Os jogos infantis, dizem os especialistas, mimetizam a vida real.
Pontapé ou beijinho
É daqueles casos em que ouvir os pediatras dizerem que os jogos imitam a vida real dá que pensar. Os rapazes correm atrás das raparigas. Quando apanham uma, dão-lhe a escolher: pontapé ou beijinho? O lima-limão é uma versão mais suave, uma das opções significa o tal beijinho, mas a outra dá direito à liberdade. Dentro do género, o Bate Pé é um clássico da iniciação sexual.
Cabra Cega
Um dos jogos mais desequilibrados de que há memória: um miúdo vendado tenta apanhar um grupo de miúdos com uma visão perfeita, enquanto estes o vão provocando. Regra geral, a “cabra-cega” fica tanto tempo sem apanhar ninguém, que uma das crianças acaba por ter pena e sacrificar-se. Um truque memorável é espreitar pela parte de baixo da venda. Neste caso, as raparigas levam vantagem: não precisam de se esforçar para memorizar que tipo de sapatos usa cada um
“O jogo é uma preparação para a vida”
Os jogos são importantes para o desenvolvimento da criança?
Muito. Aumentam as capacidades de "vivência em grupo, conversação, aplicação de conhecimentos morais, memorização, atenção e socialização", assegura Guiomar Oliveira, pediatra do desenvolvimento da Sociedade Portuguesa de Pediatria. Parecem jogos simples, mas exigem várias funções cerebrais: aplicar estratégias cognitivas, fazer uma leitura global da cena, aprender a ler as intenções dos outros e a disfarçar as suas.
Os jogos de vídeo e a televisão substituem-nos?
Não. Os jogos tradicionais obrigam a uma aprendizagem activa, explica Guiomar Oliveira. Ver televisão é uma actividade passiva. "Os resultados do 'active learning' [no desenvolvimento] são superiores." Nos jogos de vídeo, diz o pediatra Paulo Oom, manteve-se o prazer associado à brincadeira, mas sem a componente social. "O maior perigo é o jogo solitário substituir por completo o jogo em grupo."
Por que razão têm muitas vezes um lado violento e/ou erótico?
"Numa idade de descoberta, muitos dos jogos, como brincar aos médicos, são carregados de algum erotismo e estimulação. "Faz parte", explica o pediatra Gomes-Pedro. "O jogo é uma preparação para a vida." Compete aos pais e educadores canalizarem essa criatividade e carga emotiva.
É preocupante haver miúdos quase sempre dominantes ou numa posição de inferioridade?
Pelo contrário. Ensina-os a serem bons chefes, correctos e respeitadores, explica Paulo Oom. Ter de obedecer a regras de outros ajuda-os a lidarem melhor com as adversidades. "Vai ser assim a vida", reforça Guiomar Oliveira.
Quais são os melhores jogos?
Os que podem ser "jogados em grupo, com regras bem definidas e aceites por todos, que envolvam actividade física, de preferência ao ar livre", diz Paulo Oom. Guiomar Oliveira acrescenta: todos os que impliquem regras, memória e atenção (como as repetições), que imponham estratégias cognitivas para atingir objectivos.
Há jogos desaconselhados?
Os mais violentos. Os tempos em que a luta corpo a corpo era fundamental para a sobrevivência já lá vão, prossegue Guiomar Oliveira.
Brincar até quando?
Até sempre. "Não se pretende que um adulto volte a brincar à cabra-cega", fundamenta Gomes-Pedro. "Mas o humor é fundamental."
Via ionline